20 CONTEMPLAÇÃO

código: cacaco-cacaco-cacaco-cacaco-cacoco-cacoco

É hora de retirar-se para uma posição elevada e observar tudo, no seu
conjunto.

“Para voar bem alto é preciso ter coragem de
perder o contato com o solo.”

A FONTE
Dois ministros do rei disputavam constantemente o
poder. Muitas vezes faziam coisas absurdas, que prejudicavam
a todos, só para não deixar o outro ganhar alguma
vantagem. Desta vez a contenda era por causa de uma das
principais fontes de água potável do reino, que se localizava
justamente na divisa das suas fazendas.
A pedido do rei, que não queria indispor-se com nenhuma
das partes, o Mestre chamou-os para uma conversa.
Marcou o encontro, estranhamente, numa cabana de
caçadores, localizada junto ao pico de uma montanha.
— Qual de vocês consegue avistar daqui as cercas de
sua propriedade? — perguntou o Mestre, apontando para
a vastidão do horizonte, onde construções e povoados se
reduziam a pequenos pontos e manchas num magnífico
tapete verde.
Por mais que se esforçassem para distinguir as cercas
por entre as nuvens baixas que se espalhavam aos seus
pés, era-lhes completamente impossível.
— Pois bem — prosseguiu o Mestre — do alto se vê de
maneira mais ampla a realidade. Por isso os convidei para
virem aqui. De fato as cercas que vocês estabelecem não
existem. Nada está separado. Ninguém pode de fato possuir
uma parte do ar, do mar, da terra, mas apenas partilhálos
com todos os seres viventes.
Após um breve silêncio, os ministros trataram de
reconduzir a conversa para a questão da posse da fonte,
que era o que lhes interessava.
— Amarrados à ilusão da posse e do poder, vocês não
conseguem elevar-se para ter uma visão mais ampla! —
interrompe-lhes. — Mas, aproximem-se e observem bem o
que desejam possuir: a fonte. Ela nasce bem no alto daquela
montanha, coberta de densa vegetação. Certo?
— Sim! — assentiram.
— E vocês imaginam o que poderia ocorrer se houvesse
um desmatamento próximo à fonte?
— Ela secaria em pouco tempo - respondeu um dos
ministros, após um instante de reflexão.
— Ora, se um de vocês apropriar-se de tal fonte, ainda
assim dependerá essencialmente do outro, em cujas terras
se encontram as matas. Então talvez devessem tratarse
como parceiros e não como adversários. A propósito, considerem
que, se na sua disputa cega acabarem perdendo
a utilidade, vocês também perderão o poder. Procurem pois
exercer o poder de servir, em vez de se digladiarem pelas
suas posses e vaidades.
Tendo dito isto, o Mestre adiantou-se no caminho de
volta ao povoado, enquanto os dois ministros logo se punham
a discutir sobre a conveniência de uma união.

Aquele que tem o espírito elevado vê tudo do
alto, e mantém o seu olhar além dos limites do
horizonte, além dos limites do medo e das frágeis
convenções feitas pelos homens. Essa visão
ampla dá-lhe sabedoria para guiar a si mesmo e
aos que o seguem.

CONSIDERAÇÕES
- Diante de um conflito, procure uma parte de você mesmo,
ou uma outra pessoa mais experiente, que se coloque
acima e veja toda a questão com imparcialidade e ponderação,
e que, honestamente, julgue o certo e o errado, o
justo e o injusto, o que é bom e o que é mau.
- Quem se coloca numa posição elevada enxerga mais
longe e, naturalmente, exerce um domínio e liderança sobre
os que o cercam.
- Antes de aceitar ou rejeitar uma situação ou oportunidade,
é preciso que você a contemple, observando o seu
conjunto: veja se há harmonia e alegria que integre tudo.
- Se olhar além das fachadas, poderá descobrir que,
muitas vezes, atrás de uma suntuosa porta, existe um
mundo nada suntuoso.
- Somente do alto você pode ver ambos os lados de uma
montanha e, igualmente, os pontos favoráveis e desfavoráveis
de uma questão, para um julgamento acertado.
- Para manter-se numa posição elevada é preciso parar
de chafurdar na lama dos seus problemas.
- Busque sempre ver os seus desafios e problemas dentro
de um contexto mais amplo e infinito. Como se você os
observasse de um futuro bem distante, olhando para trás,
ou como se estivesse numa estrela, e lá do alto visse tudo
minúsculo e passageiro.

* Ao cavalo o seu dono o condena o uso de tapas nos
olhos, a fim de que não enxergue para os lados. E aos
medíocres são impingidos tolos conceitos e objetivos para
que não tenham uma visão ampla das coisas e, então, não
sejam livres para ir onde quiserem.

O LABIRINTO
Um rei precisava escolher um novo capitão para a sua
guarda. Convidou, então, três candidatos merecedores de
tal confiança para uma prova: deveriam percorrer o extenso
labirinto do palácio, construído com altas muralhas.
Aquele que conseguisse chegar ao final, no prazo mais
curto, seria o escolhido.
Assim que foi dado o sinal de largada, um dos candidatos
partiu apressadamente guiando-se pelas pegadas
que, por engano, julgara serem dos guardiões do labirinto.
Logo terminou num beco sem saída.
Outro também partiu logo. De vez em quando olhava
para o alto, tomando ingenuamente como referência densas
nuvens no céu. E, como as nuvens se moviam lentamente,
ele não percebeu as mudanças e ficou completamente
perdido.
O terceiro, entretanto, era mais sábio. Enquanto os
seus concorrentes já tinham-se embrenhado no labirinto,
ele procurara escalar a muralha externa, e lá do alto contemplou
toda a extensão do labirinto. Após estudar atentamente,
avistou o caminho correto e, mantendo-o fixo na
sua lembrança, desceu da muralha e percorreu o labirinto
com sucesso.
Mas houve um quarto participante, que foi indicado para
a prova nos últimos instantes. Ele também escalou a muralha,
contemplou sua extensão e, para surpresa de todos, pôsse
a percorrer o labirinto lá do alto mesmo, ignorando todas
as paredes divisórias! E, lógico, venceu a prova.
— Para governar é preciso ter espírito de águia, que
enxerga do alto, além de todas as barreiras — disse o rei
aos dois candidatos que chegaram ao final do labirinto.
E prosseguiu, dirigindo-se ao que percorrera o caminho
pelo chão:
— Você demonstrou conduzir-se de acordo com um julgamento
ponderado e uma visão determinada. É merecedor
de um cargo de confiança. Mas — voltando-se para o
outro — você demonstrou ser capaz de seguir não apenas
o caminho que lhe é traçado. Tem a simplicidade e a ousadia
para enxergar novas alternativas. Portanto ambos dividirão
o comando da guarda.

— Para atingir o objetivo essencial de sua vida é preciso
eliminar todo o conflito, todas as paredes que internamente
o dividem e afastam-no dele. De uma posição elevada,
nada realmente poderá separá-lo de sua finalidade.

* Quem está acostumado ao cativeiro sente medo da
vastidão. Assim, muitos escolhem viver entre as grades dos
seus problemas, crenças e preconceitos. Adquirem o medo
de serem livres.