59 DISPERSANDO

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É hora de dispersar suas preocupações, deixar que se desintegre o que
tem de se desintegrar, e distribuir o que não deve mais ser guardado.

“Castelos de areia à beira do mar. Tudo o que
construímos um dia no chão vai dar.”

A PRAGA
— Um rico comerciante comprou uma bela fazenda e
resolveu construir a sede bem no alto de um monte. Para
tanto, decidiu usar madeira selecionada e todo o material
da melhor qualidade. Após alguns meses, a casa ficou pronta:
um espetáculo! E ele, cheio de orgulho, se comprazia
em mostrá-la aos seus convidados, maravilhados.
Embora ninguém tivesse dado muito atenção para o
fato, sucedeu que, chegado o verão, alguns insetos começaram
a ziguezaguear pela varanda. Incomodavam um
pouco, mas logo acabaram desaparecendo, sem que nada
tivesse sido necessário fazer.
No verão seguinte, para surpresa do comerciante, os
mesmos insetos voltaram, e agora formavam uma nuvem,
de tão numerosos, e invadiam toda a casa. Foi então que
soube que se tratava de uma praga de difícil extermínio e
que consumia especialmente tudo o que era de madeira.
Mas, inexperiente e, por isso, inconseqüente, resolveu usar
um inseticida qualquer que tinha na sua dispensa. Parecia
que, após algumas aplicações, os insetos haviam de fato
sumido.
Entretanto, um verão adiante, o fazendeiro deu-se conta
de que a praga havia se alastrado silenciosamente, e já
havia consumido boa parte dos rodapés, vigas de madeira
do telhado e assoalho. Não apenas isso: a própria fundação
da casa estava comprometida! E os técnicos consultados
deram a sentença final: a casa tinha de ser demolida.
Não havia mais o que fazer.
O jovem rei ouvira esta estória do Mestre, numa conversa
sobre o incômodo contraste entre as riquezas
incontáveis que herdara e a miséria em que vivia boa parte
da população.
— Nenhum mal surge de um momento para o outro,
mas vai-se formando aos poucos — disse-lhe o Mestre. —
Assim, ao perceber que coisas ruins estão se ajuntando e
ganhando corpo, intervenha logo, dispersando-as e desintegrando-
as por completo, antes que se fortaleçam demais.
A praga que ameaça o seu reino é a miséria, a ignorância;
e só podem exterminá-la, definitivamente, a educação e a
distribuição mais justa das riquezas.
— Você está jogando fora todo o patrimônio que a sua
família juntou ao longo de séculos - tentaram os ministros
veementemente dissuadir o jovem rei, que, algum tempo
depois daquela conversa com o Mestre, decidira distribuir
os tesouros reais em benefício do povo, construindo escolas,
apoiando a agricultura etc.
A estes o rei respondeu:
— Eu não estou perdendo nada. Muito pelo contrário,
as riquezas que estavam acumuladas, estéreis dentro dos
muros do palácio, agora estão por toda a parte, dando vida.
— Você conhecerá uma prosperidade maior do que todos
os seus antecessores, porque está partilhando suas riquezas,
assim como o agricultor só conhece a colheita abundante,
quando espalha pelo campo suas melhores sementes
- disse-lhe o Mestre mais tarde, em apoio às suas ações.

Aquele que tem o espírito elevado desfaz suas
preocupações através do seu contato harmonioso
e confiante com as forças que regem o Universo.

CONSIDERAÇÕES
- Quando sentir que o que você construiu está ruindo,
procure voltar-se para o sagrado e o eterno, que permeiam
toda a existência. Então seus problemas se reduzem a quase
nada.
- Atacar o seu adversário em vários pontos, ao mesmo
tempo, pode ser uma excelente estratégia para obter vantagem,
pois oferece maiores dificuldades para a sua reação.
- Se você focaliza sua atenção apenas em si mesmo e
nos seus problemas, torna-se seu próprio refém. Olhe à sua
volta e veja que os outros também têm problemas e estão
lutando para viver. E, ao voltar-se para ajudá-los, suas inquietações
serão dispersadas num contexto mais amplo. E
você estará libertando a si mesmo.
- Cada um para um lado, cumprindo as suas obrigações
específicas, mas unidos num único propósito. Assim é
um grupo harmonioso.
- Diante de um impasse, procure distrair-se com outras
coisas, arejar a mente. Não se trata de fugir do problema,
mas de desobstruir-se, para voltar ao desafio com
as forças renovadas e uma nova maneira de encará-lo.
- Não evite nenhuma idéia, nenhuma sensação que
agora esteja passando por você. Nem tente reter ou focali-
zar-se em nada. Deixe que tudo flua. Inúmeros sons, pensamentos,
imagens, sensações estão chegando até você,
num mesmo instante, e vão-se misturando no seu íntimo.
Mergulhado em toda essa dispersão, surge um estado harmonioso,
sem esforço, sem luta.

*Como as folhas do eucalipto que caem sobre a terra
úmida e o perfumam, enquanto se decompõem e voltam a
ser solo, todas as coisas também tendem a voltar à sua origem,
fechando um ciclo e cumprindo sua missão.